Tai Chi in Hong Kong
by Lonely Planet
Pelo canto do olho vejo-a, bem perto de mim, seguindo meus passos, um a um, sem tropeçar. Não sei dançar direito, mas com ela nunca ocorreu-me de errar os passos ou pisar-lhe os pés. Já me acompanha há vários anos, quase desde quando eu vim ao mundo, cogito. Não lembro de nada desta época. Minha mãe diz que foi cesariana, e me mostrou o hospital. A súbita claridade deve ter me assustado. Mas não lembro. Contudo, imagino que já estivesse ali ao meu lado. Quando era criança brincava de fugir dela, tentava ser mais rápido, perder-me de si. Depois de várias tentativas infrutíferas consegui um dia descobrir-lhe a fraqueza. Corria rápido pela casa e me escondia num canto escuro. Ela sumia. Com o passar dos anos fui me acostumando com sua presença. Era uma amiga solidária, escutava minhas estórias, meus devaneios, em silêncio. Às vezes parecia concordar ou discordar, balançando a cabeça. Era monocromática, negra, com tons de cinza, mais claros ou mais escuros. Como eu, preferia o sol à noite. Era mais presente nestas ocasiões. Na busca de mim mesmo pensei em usá-la para tentar me compreender. Deveria ser mais fácil, uma cor, duas dimensões apenas. Pensei e penso em descrever-lhe por uma equação matemática, algum algoritmo. Talvez ajude a minha busca. E se não conseguir descobrir as respostas restará a algum que a queira estudar, na prateleira empoeirada de alguma biblioteca. Quando me for irá comigo, fiel, numa caixa escura. Dirá adeus antes da tampa se fechar.